sexta-feira, 9 de agosto de 2013

O azulejo branco-gelo - parte 2

Aviso 1: Para entender bem a história, é imprescindível ler minha postagem anterior. Basta clicar aqui.

Aviso 2: Mais palavras grandes (palavrões) a seguir. Também, não gratuitas.


Terminei aquele dia assim. Sentindo uma dor estranha. Mas comecei, mesmo assim, o tratamento que a médica havia me passado. Remédio, creme e mais remédio. Tive duas noites conturbadas, de sexta para sábado e de sábado para domingo.

O sol estava forte, e fui ao clube normalmente, como costumamos ir. E a dor ali, quase companheira já. O creme chegou a fazer efeito, isto é, tratou bem da zona que estava em carne viva. Mas a coceira havia dado espaço para a tal dor. Não todo espaço, pois a urticária ainda existia, mas me parecia bem menos importante do que a dor latejante no cu, e bem no lado esquerdo, onde o gancho do indicador da doutora havia roçado. E, naquele domingo, após o clube, fui tomar banho. E no banho, eu percebi a razão da dor.

Durante minha higiene, enquanto espalhava o sabonete - este em barra, pois o outro estava já no lixo - senti algo estranho. Era uma bolinha. E essa bolinha doía. E não era pouca coisa. Como diz o ditado, as maiores dores estão nas menores bolinhas.

Saí do banho e disse para a Mi que eu deveria ir ao hospital. E olha, quem me conhece bem, sabe. Pra eu pedir para ir ao hospital, é porque a coisa é séria. Conversamos e resolvemos dar mais um dia ao tratamento. A dor havia diminuído um pouco, provavelmente por conta da água quase fria do banho, e estava na hora de dormir. E assim deitei, um pouco assustado ainda. Mas dormi finalmente.

Dormir é modo de dizer. Eu rolei na cama, me coçava, capotava de novo, acordava me coçando e doendo. Ventilador na cara para aguentar o calor e rádio no ouvido para distrair a cabeça - sempre durmo ouvindo o programa Momentos, da COPE Barcelona. Acordei finalmente antes do despertador, justamente despertado pela dor.

Para ser completamente honesto, não era uma dor doída. O problema dela não era a intensidade, e sim a persistência. A dor não passava. Quando a gente bate o cotovelo, ou dá uma bela topada com o dedão do pé, o que a gente faz? Esfrega bem com a palma da mão o lugar dolorido, falando um Aiiii comprido, e com aquela cara de dor. Mas meu problema era dor no cu. Dor no cu não passa esfregando a mão. Ainda mais com uma dermatite ainda mal curada na região. Não passa, simplesmente.

O que eu fazia, para tentar descobrir como me livrar, ao menos por alguns momentos, daquela dor, era piscar o cu e/ou tensionar a bunda. Nada. Tentei levantar as pernas, alternadamente. Piorou. Dormir virado do lado esquerdo. Não. Lado direito? Ã-ã. Conchinha, esticado, mãos segurando as pernas. Era uma verdadeira aula de ioga na cama. Resultado: acordei com dor e cansado da maratona.

Levantei, me lavei de novo, me pomadei, me entupi de remédios e fui para o trabalho. 40 minutos sentado no trem. Parecia que meu assento estava pegando fogo, de tanto que eu me mexia. Mas, como já disse, a dor era constante e chata, mas dava pra aguentar.

Meu dia correu normalmente, de certa forma. O problema é que tenho que andar bastante, subir e descer escadas, sentar e levantar constantemente. Quando voltei para casa, conversei de novo com a Mi. Entramos na internet e marcamos uma consulta, com a mesma médica, através do site do centro de saúde. Oito horas da noite do dia oito, quinta-feira. Você aguenta até lá?, perguntou a Mi. Eu disse que sim com a cabeça, enquanto dava passos de soldado (levantar as pernas alternadamente, joelho até a altura da cintura, sem sair do lugar) para que as bandas friccionassem e amenizassem a dor e a coceira. Durante o banho daquela noite, lá estava ainda a maldita bolinha, mais irritada do que nunca.

Novamente, uma noite pessimamente dormida. Novamente ioga, rolando pra cá e pra lá. Novamente me levantei antes do despertador. Mesma rotina do dia anterior. Pomada, remédios, trem. Mas, desta vez, do trem ao trabalho eu já mostrava sinais de que as coisas tinham piorado de um dia para o outro. Eu mancava, não conseguia subir e descer as escadas sem um gemido e a ajuda do corrimão. Não me concentrava mais no trabalho que estava fazendo. Ligava constantemente para a Mi, com voz de choro e agonia, e, numa dessas ligações, resolvemos que naquela noite eu iria para a emergência.

A hora não passava, e quando deu a hora de ir embora, quase agradeci a Deus. Eu disse quase! Fui, mancando mais, até a estação, e cheguei em casa não me lembro bem como. Jantei, fui ao banheiro, tomei banho e desci para esperar a Mi. Ela chegou e fomos andando até o hospital, que fica pertinho de casa. Não naquela noite. Parecia que eu não chegaria nunca, mas cheguei.

Qual o problema dele? - perguntou a mocinha na janela de admissões. Acho que ele precisa de um proctologista - respondeu a Mi, minha intérprete. Não foram feitas mais perguntas. Recebi minha pulseira de paciente e fui até a triagem. Lá, contei a minha história, e a médica me encaminhou para a ala de cirurgia.

Cirurgia? Aí o cu trancou. Não de dor, mas de cagaço mesmo. Nem me viram e já vão meter a faca? O quê? E ainda a Mi não pode ir comigo? Tenho que seguir este enfermeiro pelos corredores do hospital até sei lá onde? Fiquei sem ação e andei automaticamente atrás do rapaz. Andamos bastante, até uma área reservada para pacientes. Ele me pediu para que eu sentasse numa daquelas cadeiras e aguardasse ser chamado. Sentei e observei a sala.

Estávamos ali eu, uma senhora numa cadeira de rodas, um rapaz também em uma cadeira de rodas (outra), uma mocinha e outro cara. A senhora e o rapaz, ambos nas cadeiras de roda, estavam do lado oposto da sala de espera. Eu, a mocinha e o outro rapaz, neste lado de cá. No meio passava o caminho por onde enfermeiros iam e vinham, ora com pacientes em macas, ora papeando e segurando um copo de café quente nas mãos. E ali esperei. Sempre trocando de banda de apoio.

De repente, ouço um "ai" bizarro, desses de filme de terror. Era a velha. A velha estava um caco. A velha levantava da cadeira, e gemia. A velha sentava de novo, gemia de novo. A velha abaixava, gemia. A velha se coçava, gemia. A velha ficava parada, gemia. Levaram a velha para um raio-x. Ai, que alívio! Trouxeram a velha de volta. EU gemi!



Começaram a chegar outros pacientes. Uma turista que não falava castelhano, uma senhora com a filha, que era enfermeira do hospital, um cara com cara de índio, um boliviano, um velho, que depois vi que era filho da velha (se o filho é velho, imagina quão velha era a velha!) e um rapaz mais novo, que parecia catalão. E esta era a cena, em sentido horário:

Eu, com o cu ralado; a velha com a filha enfermeira com algum problema no pescoço; a turista com o pé direito que parecia um pãozinho francês de tão inchado; o rapaz na cadeira de rodas com um problema na panturrilha, a velha que era mais velha que andar pra frente (era mais velha que a expressão "Mais velha que andar pra frente") gemendo sem parar; o velho filho da velha que ficava explicando pra mãe sei lá o quê; o boliviano com um corte na testa, de ponta a ponta, tapado por uma faixa fina que deixava o sangue escorrer até a sobrancelha do coitado; a esposa/namorada do boliviano (esta chegou um pouco depois); o rapaz catalão (que foi atendido rapidamente); outra velha (que também chegou depois, mas essa era quietinha); a mocinha, que ficava reclamando do tempo em que estava ali esperando (ela estava lá porque tinha um pedaço de unha dentro do dedão do pé); o rapaz, que tinha um corte na cabeça, acima da orelha direita, que gotejava sangue; e o cara de índio, que ficava inclinado para frente, com os cotovelos sobre os joelhos, segurando um saco plástico branco, no qual lia-se "Vomitador". Essa era a trupe da sala de espera.

E foi com praticamente toda essa gente que passei as quase 3 horas que fiquei naquela sala trocando de banda a cada 5 minutos para não machucar muito. Havia chegado 21h45 no hospital. Eram 00h30 em ponto quando recebi a notícia. Todos nós, ou a maioria de nós, estávamos ali esperando o cirurgião que estava de plantão. Todos nós teríamos que ser atendidos por este cirurgião. E, infelizmente, ele estava, justamente, dentro de uma cirurgia séria. Portanto, não havia previsão nenhuma de atendimento. Levantei e saí, puto da vida. Manquei até minha casa, falei de novo com a Mi, e mudamos o plano de ação.

Desta vez iríamos, na manhã seguinte, até o consultório onde minha médica atende. Ela não iria trabalhar naquela quarta, mas eu pediria um encaixe com qualquer outro médico. Daquela manhã não passaria. Tomei uma ducha - e vi que a bolinha havia aumentado - e deitei. No dia seguinte, lá vamos nós esperar uma consulta de emergência.

Esperamos cerca de 40 minutos, e fui chamado. Era uma outra médica, mas com um rostinho mais acolhedor do que a minha. Desta vez pedi para a Mi entrar comigo. Então, quando a doutora me chamou, fui até a sala dela, entrei, deixei a porta aberta, a Mi enfiou a cabeça ali e perguntou se ela também poderia entrar. A médica disse "Não sei, vocês se conhecem?". Rimos da situação, expliquei quem ela era e começou a consulta. Disse tudo o que havia acontecido. Aí ela fez de novo o mesmo pedido da outra doutora. Ela pediu para eu me sentar na maca.

(Para o próximo trecho da postagem, eu recomendo que vocês cliquem neste link. É uma música que servirá perfeitamente de pano de fundo para a leitura que segue. É só uma sugestão. Cliquem, deixem a música rolando e leiam o resto do texto, ok? Ok. Continuando...)

Aí eu já estava craque no assunto. Deitei na maca, arriei a bermuda até as canelas e me virei. Estava preparado. Olhei o azulejo branco-gelo, que parecia o mesmo, mas era outro. Era outro, mas parecia o mesmo. As lembranças voltaram e, enquanto a médica ainda pegava as famosas luvinhas azuis, olhei por cima do ombro direito em direção a Mi. Ela, reta, completamente de costas, completamente paralizada. Eu havia pedido para que ela não se virasse. Se ela girasse a cabeça para a sua direita, daria de cara um lado meu que ela não conhece. E ela não ficaria muito feliz em conhecê-lo. Por isso ela estava ali, feito estátua. Eu só conseguia ver sua nuca, mas podia jurar que dava pra ver que ela estava fazendo toda força do mundo para fechar os olhos.

Veio a médica, eu desvirei. Ela disse "Encolhe um pouco mais as pernas", e eu me preparei pro pior. Começou daquele jeito, abrindo as bandas e observando. Mas ela esqueceu do aviso sobre respirar. Tanto que eu estava prendendo a respiração, esperando o tal aviso. Não veio aviso. Veio sim o dedo dela, falando "É aqui?". E soltei, novamente, o mesmo grito da outra consulta. "Ééééé". Mas desta vez não me contive. Soltei um "ai" que faria a velha da noite anterior se sentir orgulhosa de mim. Dei dois murros de mão fechada no azulejo branco-gelo. Depois ele sumiu, de repente. Eu havia fechado os olhos.

O dedo estava dentro, fora, dentro, ao redor, na borda, no fundo. "Aqui está a bolinha", disse a agora detetive. E eu apertando minhas pálpebras, chorando de dor. Ela sacou o dedo, pediu que eu me vestisse e voltasse para a cadeira. O exame havia terminado.

Eu estava esgotado. Desci primeiro da maca, depois abotoei minha bermuda e, por um momento, fiquei ali, de pé, debruçado com as mão nas minhas coxas, arfando de cansaço. Sim, caro leitor. Dedo no cu cansa. Ainda mais depois de dois dedos diferentes em apenas 5 dias.

Meu cu tinha mais digitais do que uma cena de crime.

Sentado, ouvi o diagnóstico. Eu tenho uma hemorróida. Na verdade, duas. Uma bem interna, que é normal,seria como um primeiro estágio da doença. E a bolinha (na verdade é uma veia) era outra, que era interna por estar ainda dentro da pele, mas externa por não estar mais no reto, e sim na parede do ânus. Era para eu parar imediatamente com o tratamento que eu estava seguindo. Deveria começar a usar uma pomada própria para hemorróidas, com aplicador (cone que se encaixa feito uma tampa, para aplicação da pomada desde o reto até o cu - chegaremos lá em breve), remédio para circulação (o mesmo) e outro para a dor (melhor que o que eu estava tomando).

Fomos embora. Eu andava e olhava as pessoas, e as via me olhando, como se todas soubessem o que tinha acabado de acontecer. Falei para a Mi que no próximo verão vou armar uma barraquinha na praia, pro pessoal que não teve a oportunidade de enfiar o dedo no meu rabo agora poder fazê-lo depois. Não quero que ninguém se sinta deixado de fora.

Fui pro trabalho, aguentei as 8 horas como pude, voltei pra casa e, assim que a Mi dormiu (capotou) por conta das duas noites anteriores mal dormidas, eu fui até o banheiro, tomei meu banho diário e comecei o ritual.

Abri a pomada, furei o lacre, coloquei o aplicador, me agachei e me preparei. Disse para mim mesmo "Cara, você aguentou dois indicadores, com unha comprida e tudo. Este aplicador não é nada! É quase um dedo mindinho! Vai sem medo!". Fui sem medo. E a ponta do filha da puta aplicador encaixou perfeitamente na bosta da bolinha sobressalente, e o cutucão, que mais pareceu uma picada de injeção, fez uma dor lancinante percorrer toda minha espinha, do cóccix até a nuca, e de volta, da nuca ao cóccix. Na hora ainda escapoliu até um punzinho que, pra mim, foi meu cu dizendo "Putz...".

Mas, como queria me livrar do problema o quanto antes, fiz uma segunda tentativa. Desta vez fui um pouco mais para a direita (de quem vai) e aí foi. Mesmo assim, foi bastante incômodo. E pensar que tenho que fazer isso duas vezes ao dia me deixa desanimado. Eu ainda acho que o primeiro exame desencadeou a bolinha, e que, se eu tivesse começado um tratamento mais específico e mais cedo, provavelmente não passaria os apuros que passei, nem seria necessária a segunda dedada. Mas são especulações, nada mais.

O negócio é que estou medicado e pronto. Já passou, ou melhor, vai passar, porque já está passando. E vou levando aplicador no cu, por enquanto. Porque se isso for me livrar de levar mais dedadas no futuro, o aplicador é mais do que bem vindo. E assim estou, assim vou indo, e qualquer novidade (ou dedo) que entrar na minha vida (ou cu), eu voltarei a postar aqui, para entretenimento de todos.


Beijos e piscadelas, Nando

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

O azulejo branco-gelo - parte 1

Aviso: Palavras grandes (palavrões) a seguir. Mas não gratuitos.

Eu sou um cara bastante reservado, um pouco (muito) tímido, e este blog me ajuda a melhorar neste aspecto. Além do prazer que sinto em escrever, é claro. Mas, ao contrário do que muitos (poucos, que são os raros e ralos leitores) pensam, eu não escrevo para ser engraçado ou cômico. Eu escrevo simplesmente uma narrativa, que conta um ou vários acontecimentos e, dentro do meu ponto de vista, procuro ser fiel à realidade e aos fatos apresentados por mim.

Aí pensei se deveria ou não escrever a próxima história. O assunto é particular e muito, muito privado. Mas, como estou na chuva, o negócio é escancarar e botar a boca no trombone.

Tudo começou umas 3 semanas atrás, no fim de julho. Comecei a sentir um certo desconforto, uma coceira, um "picor", um comichão, em algumas áreas privadas particulares. Algumas não. Uma só. O cu.

Assustou? Leia a primeira frase desta postagem e depois volte para o próximo parágrafo. Obrigado.

Tenho certeza que 100% dos que estão lendo já sentiram isto. É tão normal e comum como fazer xixi e cocô. Ainda mais neste verão de 40ºC daqui (quando o dia está 36ºC, a área da bunda pode alcançar até os 64ºC). Mas enfim, a situação foi piorando com o passar dos dias, e o que era uma coceirinha esporádica se transformou em urticária braba, dolorosa e dolorida. Até que resolvi, nesta última sexta-feira, dia 2 de agosto, procurar assistência médica.

Era meu dia de folga, e, apesar de não querer perder meu precioso miniferiado num consultório médico, a situação era desesperadora. Não tem coisa pior do que sentir uma coceira e não poder coçar. É como aquela poeirinha dentro, lá dentro do nariz, que faz aquela coceguinha desgraçada, e o espirro não vem, e a gente fica olhando pra cima, com a cara esticada, as narinas abertas, a boca escancarada e os olhos entreabertos, esperando que a sensação de espirro se torne um de fato.

Enfim, eu já estava bastante machucado. Apesar da minha vigilância e persistência, meu problema era durante a noite. Eu acordava várias vezes, me coçando copiosamente, e, segundos depois, aquela ardência. Minha bunda estava em carne viva. Quando eu tomava banho, ao menos 50% do tempo era para lavar a bunda. Primeiro porque a água, ao entrar em contato com a carne viva e assada, parece ácido puro. Segundo porque eu fazia questão de me lavar bem, mas bem mesmo. E naquela semana a gente estava de sabonete líquido novo, chique, cheio de coisas boas pra pele. Aí usava e abusava do sabonete na minha higiene.

Não teve jeito. Tive que tomar um banho extra, esperar a Mi chegar do trabalho naquela tarde e ir até o Hospital del Mar tentar uma visita de emergência. Fiz isso, e fomos andamos até lá. Chegamos, e consegui ser encaixado. Sentamos e esperamos por, não sei ao certo, talvez uma meia hora, não lembro. Quando a sensação de chegar perto do alívio toma conta da gente, o tempo é absolutamente secundário. Então, depois de certo tempo, fui chamado.

Entrei sozinho. Era minha primeira visita a esta médica, e portanto tive que responder as perguntas de praxe. Alergias, vícios, doenças na família, doenças crônicas. E eu lá, sentando sobre a banda direita, me equilibrando na cadeira, enquanto eu tentava decifrar o catalão da médica. Entender o catalão é bem difícil. Com o cu assado, fica praticamente impossível.

Então veio a pergunta. Qual o seu problema? Sabe o que é, doutora - comecei, gaguejando meu castelhano débil. É que, há mais ou menos três semanas, comecei a sentir, bom, é que... "me pica el ano" (havia treinado a frase durante toda a semana). E agora está doendo bastante, porque durante a noite eu me coço e me machuco.

A médica, séria, me olhou por cima do seu par de óculos, com cara de quem estava prestando bastante atenção. Provavelmente devia estar conversando consigo mesma, algo como "É, e hoje de manhã, enquanto eu comia meu café com pão e manteiga, eu nem poderia imaginar que em algumas horas eu iria ficar cara-a-bunda com o barba".

Após pensar por alguns minutos, ela balbuciou algo em catalão e apontou, com as sobrancelhas, a maca no canto da saleta. Eu entendi, asenti e me sentei na maca. Ela pediu para eu me deitar, e eu me deitei. Em silêncio ela se sentou em uma cadeira giratória, baixa, da altura da maca, e rolou até o armário, perpendicular à cama. Ali, à esquerda, sobre uma mesa, uma caixa de papelão. De lá sacou duas luvas azuis e voltou patinando até mim. Disse "Vira". Eu virei. Disse "Abaixa a calça", e eu o fiz. E começou o exame.

Aos de coração fraco e estômago sensível (e vice-versa), o conteúdo a seguir é bem explícito!

Foi tudo muito estranho. Ela abria as bandas como quem procura por toalhas entre dois travesseiros, ou quando buscamos uma determinada camiseta entre tantas outras dobradas dentro do gaveteiro. Sabe? Abre, olha, fecha, abre de novo, olha mais um bocadinho. Pra mim até que estava legal, curti bastante, porque o arzinho gelado estava refrescante, e era a primeira vez em três semanas que eu não sentia aquela angústia de coceira. Ela dizia que estava tudo muito, mas muito machucado, provavelmente por conta das coçadeiras noturnas. Viu, olhou e observou. Até que ela disse "Respira. Respira fundo e continua respirando".

Eu não entendi direito na hora. Estava lá, deitadinho, olhando para o azulejo branco-gelo, esperando a médica terminar o exame, quando, de repente, ouço esta frase. Mas poxa, pensei, eu estou respirando e vou continuar respirando. Qual o problema dessa méd.... O dedo entrou todo e de supetão. Assim, todo. Senti o dedo todo entrando. O cu estava tão sensível que consegui sentir até a cor da unha da mulher. Era uma cor especial, chamada "vermelho-de-foder", conhecem?

Meus queridos, reparem bem, não foi a dor. Foi a surpresa. O espanto. Foi tudo de repente, sabe, sem nada. Nem um aviso direto, nem uma contagem regressiva, nem um lubrificantezinho, nem um vinho, nem um cafuné.

Eu, como homem quase-velho, já venho sentindo a assombração que nasce a partir da piada brasileira mais famosa/antiga/preconceituosa que existe no nosso mundo masculino. "Ao fazer 40 anos, é necessário o primeiro exame de toque". E eu, ali, 4 anos adiantado, totalmente entregue, sendo descabaçado em plena luz do dia.

Na hora parei de respirar. Aí lembrei da frase que a médica havia dito poucos segundos antes, e pensei "Ah, tá. Não era uma frase. Era um aviso". E eu lá, em posição fetal, parecendo uma marionete com um dedo no meu cu, olhando fixamente o azulejo branco-gelo. Nunca mais vou esquecer do maldito azulejo branco-gelo.

Dói assim?, perguntou a médica. Nã-nã-não, doutora, respondi sinceramente. E não doía mesmo. Aí a filha da puta disse "É, mas aposto que assim vai doer".

E, acompanhando a frase, o seu indicador começou a rotacionar para para a direita, e a tomar forma de gancho. E foi assim, em câmera lenta mesmo. Ela dizia "assim" e girava, "vai", girava mais, "do", girou os 90º, "er", fez o gancho com o dedo.

Aí, companheiro, quase dei a luz. Fiz um "Éééé" meio gritado, meio abafado, e bastante sofrido. Aí doeu. Parecia que a mulher tinha desrosqueado meu cu. Me senti uma garrafa de vinho, e o cu era a rolha. Eu esperava até ouvir um "póf" quando ela tirasse o dedo. Mas ela não tirava. Ela mexia o dedo. E eu sentia o dedo mexer dentro do meu estômago. O choro na garganta, minha mão tapando o azulejo branco-gelo, e minha vida toda passando feito uma projeção dentro do meu cérebro. E a cena final era a lazarenta enfiando o dedo no meu cu e rodopiando. Faltou gritar "U-hú!" enquanto rodava o dedinho.

Não sei quanto tempo isso durou. Talvez uns 3, 5, 6 segundos. De qualquer forma, foi tempo demais. Eu não estava psicologicamente preparado para isso. Ela sacou o dedo de lá (e não fez o "póf" esperado), rolou até a lixeira, jogou as luvas no lixo e foi até sua mesa. Me deixou lá, largado, de lado, perninha junta, joelho com joelho, com a bunda exposta, levemente rotacionando meu corpo no próprio eixo, num ninar solitário. Ela disse "Pode vir". Eu me virei, abotoei a calça ainda deitado, me levantei calmamente, porque minha pressão tinha ido lá pra baixo - na altura do cu provavelmente -, respirei duas, três vezes e saltei da maca. Andei a passos de tartaruga, pé ante pé, até minha cadeira. Lá sentei com cuidado redobrado, peguei minha mochila e a abracei. Era, claramente, um escudo que eu adotara naquele momento de fragilidade.

Ela disse que eu tinha uma dermatite bem feia, provavelmente causada pela troca de sabonete líquido ou de toalhinhas umidecidas (filha da puta do sabonete líquido novo, chique, cheio de coisas boas pra pele...). E que a dor que eu havia sentido no exame era por conta de algumas hemorróidas internas, que são normais até e, portanto, não precisaria me preocupar com elas tão cedo.

Me receitou uma pomada corticóide, um remédio para a circulação (para evitar que as hemorróidas progredissem) e um paracetamol para a dor das assaduras. Durante a digitação dos remédios, ela fazia piada, dizendo que este tipo de exame realmente "molesta mucho". Molesta, doutora. Molesta mais do que a senhora pode imaginar...

Ela imprimiu a folha e, com um sorriso, a entregou para mim. Eu recolhi o papel, disse obrigado - ainda o troxa agradece!? - e saí. Encontrei a Mi no corredor. Ela me viu, achou minha cara estranha (mais do que o normal) e ficou me fazendo perguntas.

Eu comecei a contar toda a história e, de repente, reparei que os dedos dos meus pés estavam brancos, tesos, afundados nas sandalhas, como quem está a beira de um precipício. Levei muito tempo tentando relaxá-los, e quando consegui já havíamos chegado em casa. Os dedos já estavam bem. Mas o resto ainda estava completamente traumatizado. Fui, tomei um banho de meia hora, eventualmente chorando agachado no cantinho do banheiro abraçado ao meu ursinho de pelúcia, coloquei um calção bem largo e fui tirar uma soneca.

Acordei suando, assustado. Levantei, fui até a sala e encontrei a Mi. Eu disse "Mi, tive um pesadelo terrível...". Ela, com um sorriso geométrico no rosto, respondeu "Não, não foi pesadelo", e me mostrou a receita da médica. Eu gritei (internamente), e sentei na cama. E na hora em que eu sentei, veio uma dor. Dor nova. Era a que eu havia sentido no exame, mas totalmente fora do contexto. Isto é, a mesma dor, agora sem o dedo para acioná-la.

No fim das contas, a médica estava errada.
E o meu pesadelo estava apenas começando.

Apagam-se as luzes. Fim da primeira parte. Fecham-se as cortinas.
Beijo doído e até breve com a segunda parte da saga "O azulejo branco-gelo"

quarta-feira, 31 de julho de 2013

O que era pequeno...

Vou tentar fazer um texto rápido e conciso, para combinar, inclusive, com o tema do mesmo.

Sim, senhoras e senhores - e quando digo senhoras e senhores quero dizer mãe, sogra e amigos mais chegados -, vou novamente falar do meu pequeno, ridículamente pequeno, banheiro.

Recentemente, este nosso nano-cômodo recebeu uma melhoria(?): uma porta de vidro para a parte da ducha. O problema é que bastante água escapava para além da área do chuveiro durante nossos banhos, e tínhamos que manter uma toalha no chão do banheiro, ao lado da tal área. Após a chuveirada, a toalha ficava sempre enxarcada, e o banheiro ficava um nojo, molhado e úmido. Aí o dono foi e teve a ideia de colocar uma porta para a ducha. Eu queria perguntar "Onde?", mas não sabia dizer "Onde?" em catalão.

Mas, bom, a porta foi instalada, e a porta é linda, de vidro transparente com listras de bolinhas brancas. Show. A única coisa é que o que era pequeno, ficou menor ainda.

Antigamente nós tínhamos uma cortina de plástico de banheiro com haste dupla (invenção deste que vos fala escreve - obrigado, obrigado), e, portanto, durante o processo do banho, se houvesse a necessidade de esticar um cotovelo aqui ou um joelho ali, não havia maiores complicações. Agora não. A porta, com dobradiça sanfonada, que abre para dentro da área do chuveiro, uma vez fechada, delimita definitivamente a área útil. E, teoricamente, impede que qualquer aguinha fuja do ralo para a qual está destinada.

Agora, sobre a área útil que restou para tomar banho. No meu caso, quando estou de lado, dentro da tal área, a parede à minha esquerda e a porta à minha direita ficam justas com meus ombros. Não chegam a tocar minha pele, mas roçam os pêlos dos meus ombros (nota pessoal: jamais falar novamente sobre pêlos nos ombros). Consigo ficar parado, reto e ereto, segurando a respiração, claro, mas cabe como uma luva. Mas quem é que toma banho assim? Temos que nos mexer, esfregar, enxaguar, enfim, trabalhar o corpo. Mas se eu fico de lado, tenho que manter os ombros completamente retos, parados, e utilizar apenas os braços, e apenas para cima e para baixo.

Ou seja: pareço um marionete Lango-Lango de 1,80m.

O jeito é tentar de lado. Quer dizer, com a porta na minha frente e a "torneira" - ainda não sei o nome correto, mas vou descobrir -, com seus canos externos (dois, um de água quente e outra para água fria) nas costas, na altura dos rins. Hoje tentei tomar banho nesta posição.

Após entrar na área de banho tranquilamente e ligar o chuveiro alegremente, e depois de fechar a porta sanfonada com alguma dificuldade, fiquei, então, de lado. Aí senti aquela liberdade - em comparação à primeira posição, claro está - e me abaixei para pegar o xampú. Abaixar eu já aprendi. Descendo dobrando os joelhos, com as costas retas sempre. Não por ser a forma correta de se abaixar. E sim por ser a única forma de se abaixar ali. Enfim, derramei uma quantidade do xampú na mão direita - mais pra barba do que para outras partes já "calvizadas" -, deixei o xampú de novo no chão, me levantei e me preparei para lavar a cabeça. Foi quando senti a primeira dor.

Eu, de frente para a nova porta, tentei levantar ambos os braços para lavar a cabeça. Mas o espaço da ducha é exatamente a envergadura que tenho de cotovelo a cotovelo. Isto é, levantei os braços juntos e travei os dois cotovelos nas paredes do banheiro. Travei.

Eu lá, posição-jesus-na-cruz, com dor de cotovelo e xampú em ambas as mãos. Soltei um ai. Num gesto calculado, abaixei o ombro esquerdo e levantei o direito e me libertei, mas o ombro direito, pela posição rara, reclamou e deu uma patcha estalada. Segundo ai. Encolhi os dois ombros, ao mesmo tempo, ainda naquele alinhamento estranho diagonal, e assim, encolhido em mim mesmo, tentei alinhar ombros e braços, e, infelizmente, automaticamente meu corpo dobrou para frente. Cano de água quente no rim direito. Terceiro ai. Imediatamente, por conta do choque que se sente, estufei o corpo todo para frente, como um galo. E enfiei a piromba na porta de vidro fria e novinha. Aí já saiu um ui.

Gritei pela Mi. Ela veio. Tentei explicar o acontecido, mostrar como tudo aconteceu. Ela chorou. De rir. E foi embora. Eu fiquei, terminei meu banho, bamboleando para não repetir meus erros.

Resultado: não caiu nem um pingo pra fora da ducha, e a filha da puta da toalha continua sequinha. Que bom!


Fico por aqui. Beijos apertados e abraços molhados (e vice-versa) a todos e todas.

Nando, o "geco" de Barcelona

quinta-feira, 11 de abril de 2013

E eu caí

Dia 10 de abril de 2013. O dia foi especialmente bom. Tudo havia dado certo no meu trabalho. Um dia antes, inclusive, eu estava tremendamente gripado, e tive que sair mais cedo do serviço para me cuidar. Cheguei em casa podre, moído mesmo, e a sorte é que a Mi estava aqui para me receber. Ela me preparou o almoço, e me deu remédios - 2 ou 3 - e dormi até não poder mais. Depois acordei, já de noite, e comi mais um pouco, tomei mais remédios, tomei banho (pronto, já o fiz (piada interna)) e dormi de novo, até o fatídico dia. E este dia, novo dia, foi especialmente bom.

No trabalho comecei o dia preparando minha sala para receber minha nova assistente/roomate, importada (in)diretamente da Romênia. Me arrastava pelo chão em busca de fios e cabos, porque já me sentia melhor e bem depois da pausa do outro dia, e preparava e instalava os novos computadores. Trabalhei tanto que saí 20 minutos depois das 18h, o que é absolutamente raro. Mas o dia em si foi muito bom, cheio de risadas e projetos terminados. Eu estava bem, e com a cabeça bem cheia também.

Como estamos com muitos projetos, e agora preciso passar alguns deles para frente, precisei pensar redobrado. E não é fácil fazer isso. Quer dizer, ficar ocupado e tentar fazer outra pessoa ficar ocupada, uma vez que eu tenho que dar as instruções para que a outra pessoa se ocupe, o que me impede de ocupar-me com o que realmente é importante. Enfim, eu estava bem, mas com mil coisas passando pela cabeça. E foi assim que andei até a estação de trem.

Cheguei lá às 18h38, e faltavam alguns minutos ainda para o próximo trem. Por isso fui caminhando lentamente, pensando e planejando, enquanto terminava meu cigarro e ligava para a Mi. Conversamos pouco. Eu estava sem foco. Desliguei e mirei o horizonte. Sabe quando você perde o olhar no horizonte? O meu eu perdi no da minha esquerda. Chegou o trem na plataforma 1. O que indica que o meu trem, da 2, chegará em alguns instantes.

Preparo minha mochila, alinhando-a às minhas costas, e, com as mão nos bolsos, me posiciono perto de onde sei que parará a porta do trem. É a primeira porta do primeiro vagão, porque assim não tenho que andar muito para sair da estação final quando lá chegar. Estamos lá, eu e uma moça, quando avisto o trem chegando. É o trem de dois andares que vem vindo, um trem mais antigo que os outros da mesma linha, mais trem e menos metrô. E ele chega, e vem vagarozamente até onde estou, e a porta está justamente onde eu queria. Eu, cavalheiro como sempre, fico atrás da moça, e assim que ouvimos o barulho da pressão que destrava o sistema de portas, ela pressiona o botão verde, e a pesada porta abre ao meio. Ela sobe. Eu não.

Estes trens mais antigos possuem um degrau fixo, que, por motivos óbvios, precisam manter certa distância da plataforma. Este degrau é dividido ao meio, por motivos nada óbvios, deixando um vão pronto para alguém desavisado ou, no meu caso, desfocado, ferrar alguém. Quando fui subir no trem, sem perceber coloquei meu pé neste vão. E eu caí.

Eu caí no vão entre o trem e a plataforma. Fiquei pendurado, com o corpo em formato de um Y. Veja este Y. Agora imagine que o tracinho no canto superior esquerdo seja meu corpo, o tracinho no canto superior direito é meu braço direito, e o tracinho reto, pra baixo, é minha perna esquerda. Este era eu, dependurado na lateral do trem, com uma perna caída no vão entre o vagão e a plataforma, e segurando firmemente com a mão direita a barra de segurança na lateral da porta, enquanto meu quadril estava na altura do chão do vagão e minha mão esquerda segurava firmemente a alça da minha mochila, colada ao meu peito.

Tudo isso durou cerca de 1 segundo, talvez menos. A moça, que havia subido, ouvindo o barulho, aquele "tump" oco, virou-se e foi me acudir. Eu disse que estava bem, e tudo, mas o susto fez jorrar adrenalina nas minhas entranhas, e não percebi que havia acontecido o pior. De qualquer forma, agradeci e fui checar meu joelho. A esta altura já estava dentro do trem, pois eu havia conseguido me puxar para o vagão, incrivelmente sem muita dificuldade. A remota possibilidade de um cena deixa a gente com poderes sobrenaturais.

Continuando, comecei a checar meu joelho esquerdo. O "tump" oco que fez com que a moça se virasse para ver o que havia acontecido foi o barulho do meu joelho esquerdo batendo e arrastando contra a lataria do trem. Ele - o joelho, não o trem - aguentou todo o peso do meu corpo, e fez com que eu travasse no Y. Se não fosse por ele, eu não seria um Y. Seria um I. E sem o barulho, a moça não viraria para me ajudar, eu não teria forças para me segurar, o trem começaria a andar e eu viraria um __.

Olhei para meu joelho, passei a mão por ele, e estava quente, o jeans marcado com sujeira e ferrugem, mas intacto. Jeans bom, pensei. Mas, como já disse, o pior estava por vir. Por sorte, ninguém, além da moça, havia visto. Este trem possue uma espécie de antesala onde ficam as portas, e é preciso descer e subir escadas para chegar aos lugares com os assentos, que, naquele momento, estavam 50% cheios. Depois de firmar a perna e perceber que o joelho aguentaria numa boa, e que tudo não passara de um susto que viraria uma boa história, quiça um bom post para este blog empoeirado e abandonado, subi as escadas e andei pelo corredor em busca de um lugar para sentar e me recuperar.

As pessoas me olhavam, e franziam suas caras sérias. Mas não é possível, ninguém havia me visto ou visto o que havia acontecido!, pensei com meus botões. Segui meu caminho até o fim do vagão, desci as escadas e me sentei numa espécie de assento retrátil, que ficava na outra antesala, onde estavam as segundas portas do primeiro vagão. Ali sentei, e minha bunda gelou. Literalmente. E percebi que algo havia acontecido. Como disse antes, o pior.

Além do dia ter sido bom para mim, pessoalmente, foi um bom dia em relação ao clima. Fazia calor, e foi a primeira vez que fui ao trabalho, desde novembro do ano passado, sem uma blusa de frio. Só com meu blaser e uma camisa fina. Maldito tempo bom. Porque quando senti que minha bunda gelou ao sentar, de duas, uma. Ou eu estava cagado/mijado, o que não faria sentido, porque provavelmente a sensação seja mais de quentura que de frio, ou eu estava diretamente sentado no estofado frio do assento. Como se estivesse sem calça. E eu posso assegurar: eu não estava cagado/mijado.

Sim, caro blogspectador. Quando meu corpo fez o Y, obviamente minha calça, que era um jeans do tipo saruel, não foi elástica o suficiente para acompanhar a abertura das minhas pernas. E rasgou. Rasgou não, porque a gente fala rasgar e pensa em quê? Num rasgo, um rasguinho, né? Não, ela esgarçou, desde o joelho direito até em cima, no fim do zíper. Esgarçou porque arrebentou o jeans, mesmo, criando uma abertura tão reveladora quanto ridícula, que nem a calça do Hulk seria capaz de sofrer.

Tudo então fez sentido. As caras sérias me olhando, a bunda gelada e o arzinho que me ajudou a retomar o fôlego quando atravessei o corredor lotado do vagão. Imediatamente coloquei a mochila no colo e aí sim minha mente foi a mil. Comecei a escrever para a Mi pelo celular, e a pensar no que eu ia fazer. Como vou chegar em casa caminhando? Cadê minha blusa de frio para amarrar na cintura? Putz, vou passar em frente ao metrô de Barceloneta, que a esta hora está sempre lotado! Justamente hoje eu tinha que usar uma cueca vermelha?

E meu joelho havia começado a doer, e eu tentava me comunicar com a Mi, mas ela escrevia vagarosamente. Piorou quando finalmente consegui contar o que havia acontecido. Não com tantos detalhes, mas com muito mais palavrões. Ela mal me respondia, e quando o fazia, mandava frases sem muito nexo e com erros de digitação. Deve ser difícil desenvolver um texto e teclá-lo em seu celular enquanto você rola de rir. Tadinha.

No fim, tracei meu plano. Eu usaria meu blaser como escudo traseiro - para o mesmo -, amarrado feito moleton dos anos 1990. Eu seguraria a mochila na frente, tapando a visão frontal, e assim caminharia até minha casa. Era um bom plano. Esperei mais 2 estações, até chegar na final. Me preparei para descer. Desci. Mirei o portal de saída, e comecei a andar. Aí percebi o primeiro problema.

A mochila, que é grande, era atingida por minhas coxas quando eu tentava andar. Isso fazia com que ela rebolasse para lá e para cá, girando no próprio eixo, aumentando absurdamente seu peso. Minha mão não aguentaria muito. Percebi que deveria diminuir a marcha, e seguir em frente, a passos curtos, porém firmes. E assim fui caminhando, e assim tardei meia hora para fazer um caminho de 7 minutos.

Eu passeava por entre as pessoas, olhava o céu, e estava tudo bem. Mas no fim do caminho, a adrenalina finalmente baixou, e as dores começaram. Doía tudo. Coxa, costela, mãos, e principalmente o joelho esquerdo. Liguei pra Mi com a mão que estava livre e a fiz acompanhar-me por todo o resto do caminho. Eu sentia que ia desmaiar no meio da rua, e as pernas estavam bastante bambas. Mas, graças a ela, cheguei em casa. Aqui, desmoronei por uns minutos, mas logo me coloquei de pé. Tirei a calça e, quando vi meu joelho, imediatamente coloquei a mão no saco.

É que havia uma bola nele, de uns 6 ou 7cm de diâmetro, e cheguei a pensar que uma das minhas bolas havia caído até o joelho com a batida. mas não era isso. Foi só a batida mesmo. E tudo foi só um susto. Um susto que virou uma história boa, que virou um post que deixa este blog menos empoeirado e abandonado.

E, para quem não crê ou acha que tudo não passou de "aumentação" de história da minhas parte, que tal algumas fotos para provar o acontecido?





Estamos bem, e vamos seguindo na luta. A calça foi pro lixo, e o joelho tá melhor. Tenho esperança de que voltarei a postar mais e mais neste blog, ou talvez, quem sabe, um videozinho ou outro, contanto coisas importantes, casuais, dando notícias, enfim, aparecendo. Não queremos deixar a distância física influenciar nossos relacionamentos com o pessoal daí. E não deixaremos.

Beijo manco e até logo

domingo, 20 de janeiro de 2013

2013 - É hora de mudança

Ps.: Não pedirei desculpas aos falsos puritanos por certas palavras e pelo linguajar que usarei. Não sou Shakespeare, infelizmente. Nem Paulo Coelho, graças a deus.


Começo de 2013, é hora de mudanças. Depois de 2 anos e 4 meses compartilhando um apartamento com várias pessoas de diferentes nacionalidades e personalidades, resolvemos procurar algo nosso, só pra gente, nosso ninho, nossa bat-caverna, nosso cafofo, nosso barraco, nossa goma. Nosso lar.

O bairro escolhido foi Barceloneta, próximo de onde morávamos (inclusive é a mesma caixa postal), mas muito perto da praia, da estação de trem, metrô e da marina. São 2 minutos caminhando até a biblioteca, 3 minutos de bicicleta do calçadão, e 5 do clube do qual somos sócios.

Estamos felizes, muito felizes. Não só pela privacidade que poderemos recuperar, mas pelo passo gigantesco que estamos dando. Caramba, vamos ter nossos nomes em contas de luz e água e gás! Assinamos um contrato de locação! É uma vitória pra gente, depois de pastar por este tempo todo em terras estranhas. Parabéns para nós! Mas o que queremos compartilhar aqui é o nosso novo "apertamento", para que vocês, amigos, famílias e bisbilhoteiros de plantão possam, após a leitura deste texto, poder fechar os olhos e se imaginar aqui, chegando para nos visitar, sem a necessidade de pagar passagem de avião.

Então, sem mais delongas, vamos à descrição completa desta visita guiada.

O prédio

Chegando em frente ao prédio, vemos a pintura rosa-salmão ainda nova contrastando com as construções antigas. Roupas penduradas nas sacadas longas secam e se molham com as roupas molhadas dos vizinhos de cima. Os detalhes em branco completam o visual. No térreo, a ABCA, com sua porta de madeira, emite sons abafados de conversas, risadas e fumaça.

Mas uma das sacadas, no entanto, não possui roupas, nem bicicleta, nem tralha. É a sacada vazia de um apartamento vazio, mas não por muito tempo. É o nosso apartamento. A porta de entrada do prédio fica do lado direito.

Ao abrir a porta do prédio, vemos uma pequena saleta (em obras) com o relógio da luz e as caixas de correio. Encostada ao lado direito da parede (em obras), a escada (em obras). No começo do lance, na altura do pescoço, o interruptor de luz. Ao ser pressionado, um leve estalo (pléc), e as luzes se acendem em todos os andares. Enfim, subimos os lances, com cuidado para não encostar no corrimão (em obras).

Quando chegamos ao nosso andar, nossa porta parece bastante austera, com sua madeira vinho e maçaneta no centro do retângulo. Colocamos a chave, abrimos com certa dificuldade - em breve explico o porquê - e a porta se abre.

O apartamento

A entrada é simples. Pois não há. Entrou, já tá dentro, sabe? Então, do lado direito, a porta do banheiro, que será o último capítulo deste texto (o banheiro, não a porta, se bem que a porta do banheiro terá uma história à parte). Logo em seguida, a cozinha, nova e branca, com armários novos e brancos. Na parte de baixo da cozinha, um fogão estilo "cook top" elétrico, chiquetezérrimo, sobre os paneleiros, e do lado direito, uma máquina de lavar roupas.

Logo em frente é a sala/sala de visitas/sala de jantar. Do lado direito, o quarto do casal, e do lado esquerdo o quarto de visitas. Em frente, uma porta que leva à sacada.


Na verdade não há o que falar do resto do apartamento, porque está todo vazio, todo novo e todo branco. A geladeira chega esta semana ainda (ainda não nos mudamos, só em Fevereiro), além de outros último retoques que estão sendo feitos, mas muito pouca coisa falta para que possamos começar a mudança.

A porta


É claro que uma das nossas preocupações era com a segurança. Houve um aumento bastante grande de roubos de casa aqui em Barcelona. Isto porque, com toda a crise europeia, que, desde 2008, quebrou e segue quebrando os bancos espanhóis, os cidadãos catalães preferem guardar suas economias debaixo de seus colchões, dentro de suas cuecas (na cômoda, não enquanto a usam) e calcinhas, escondidas no pote de açúcar. Mas enfim, não é nada alarmante. Geralmente os bandidos procuram por casas maiores. Se vier um desses visitar nosso apartamento enquanto não estamos, é capaz do pobre coitado deixar uns Eurinhos pra gente.

Bom, voltando à questão da segurança. Depois que eu vi o sistema de tranca da nossa porta - que é a razão de ser tão difícil trancá-la ou abri-la -, fiquei mais sossegado. São 5 barras de ferro laterais, além de duas barras de ferro adicionais, uma no topo da porta e outra na parte de baixo. A porta é bastante pesada e maciça, e o formato interno da fechadura - e da chave - é diferente de tudo que já vi.

Basicamente, é isso. Nossos 35m², só nossos 35m². Sim, 35m². Parece pequeno, não é? Pois é: e é. Bem, bem, bem pequeno. Tanto que todas as portas, com exceção da de entrada, são de correr, não de abrir e fechar. Não que eu me importe com nada disso. Tendo um teto, uma porta (com uma puta duma tranca) e uma cama, tô feliz. Ah, e claro, com um banheiro. E é aí, companheiro, que a porca torce o rabo. E é isso que vou descrever pra vocês agora.

O banheiro


O banheiro. Por onde começo? O banheiro - ou aquário de cocô, como gosto de chamar, por não ter janela, apenas um exaustor fraquinho, que não deve aguentar uma feijoada completa - é a primeira coisa que se vê ao entrar no apartamento. Está escondido (ou coberto?) por uma porta de correr branca e pesada. Abrindo esta porta, o banheiro. Do lado direito, o vaso. Do lado esquerdo, o box. No centro, a pia. E é só. É isso. Acabou. Pronto. Esse é o banheiro.


Para ser sincero, a Mi havia me dito que era um banheiro minúsculo. Isso porque só vi o apartamento após assinar o contrato, porque confio na Mi cegamente. Ou confiava, não sei ainda direito. Ainda preciso decidir depois dessa. Mas de tanto ela me falar desse danado desse banheiro, quando o vi, ele até que não pareceu tão pequeno assim. Mas, mesmo assim, é pequeno sim. Minúsculo.


Além de tudo, a descarga do vaso é apenas uma corrente, ligada a um puxador de plástico no elo de baixo, que surge - simplesmente surge - do teto acima do vaso. Estranhíssimo. E o chuveiro, dentro do box sem portas, fica na altura do meu pescoço. E não posso simplesmente flexionar meus joelhos quando quiser lavar o rosto ou a cabeça, senão minha bunda sai da área do box e entra na área da pia, correndo o risco até d´eu escorregar e cair sentado na torneira cromada. Dói de imaginar.

Finalmente terei um banheiro onde eu possa tomar banho no box, fazer xixi no vaso E lavar as mãos na pia, tudo ao mesmo tempo. Mas tenho que pensar positivo, e já fiz, inclusive, o esquema dos meus banhos. Segunda, quarta e sexta, lavo a parte da frente. Terça, quinta e sábado, lavo a parte de trás. Domingo fica o dia do banho Tcheco.

O ruim é ter que fazer cocô no banheiro e limpar a bunda na sala. Porque o banheiro é pequeno, mesmo. Meu banheiro é tão pequeno que é o único onde a pessoa fica mais apertada quando está dentro dele. Mas tudo bem. Eu me viro. Só não me viro no banheiro porque aquela merda é REALMENTE muito pequena.

E ainda tem a porta, que é de correr, e não veda, não fecha o banheiro. Dá pra espiar o cidadão lá dentro, fazendo sua obra. E se a pessoa estiver com fome durante os trabalhos, dá até pra passar uma pizza pela fresta da porta. E é tão pequeno, que ecoa tudo, qualquer sonzinho, sabe? Então, a criatura ali, desamparada, com as calças arriadas, sem ter pra onde correr, tem que fazer o máximo de silêncio possível. Ou cantar, ou limpar a garganta, ou disfarçar de algum jeito. Porque é realmente desagradável, a gente alí, na sala, jogando cartas ou lendo um livro, e vem aquel som de cocô caindo na água do vaso... E com eco!

Agora chega de banheiro e filosofias escatológicas. O importante é o apartamento. É nosso! Então, estão todos convidados! Mentira. Só vamos convidar quem realmente gostamos. Vocè não foi convidado ainda? Ahn... É que quando ligamos, deu ocupado.

Apenas lembrem-se. Quando vierem, não precisa trazer nada. Nem toalhas, nem roupa de cama, nem comida. Talvez, um penico. É, melhor.

Beijos enormes

Nando (e Mi, que me sacaneou, porque pra ela o banheiro tá até de bom tamanho...)